28/03/2016 – Canal do Produtor
Além da Páscoa, comemorada por muitos com troca de ovos de chocolates, neste fim de semana, mais precisamente no sábado (26.03), também é celebrada outra data especial para quem aprecia o produto: o Dia do Cacau. Fruta de importância histórica para o desenvolvimento brasileiro, a produção de cacau envolve milhares de propriedades no país, localizadas em sua grande maioria no Sul da Bahia. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), as federações da agricultura e pecuária e sindicatos de produtores rurais parabenizam a todos que contribuem para o desenvolvimento da cultura.
A produção de cacau acontece em seis estados brasileiros, alcançando 66 mil propriedades rurais, 33 mil delas no Sul da Bahia, maior estado produtor, seguido do Pará. A elevada rentabilidade obtida com o cultivo, em meados do século passado, e as condições de solo e clima favoráveis impulsionaram a rápida expansão da cacauicultura e a consolidação da agroindústria do cacau no Brasil. Entretanto, no final da década de 80, a atividade foi afetada por uma grave crise estrutural e conjuntural com o aparecimento e a propagação da doença vassoura-de-bruxa.
Os problemas motivaram a reestruturação da cadeia produtiva do cacau e, nos últimos 12 anos, a produção voltou a crescer, reflexo direto da adoção de tecnologias desenvolvidas pela pesquisa e assistência técnica dos centros da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Os resultados são verificados nas safras, desde 2003. Naquele ano, a produção era de menos de 170 mil toneladas e passou, em 2013, para 261,7 mil toneladas de amêndoas secas. E em 2014, a produção continuou em ascensão, com 279 mil toneladas, a maior safra dos últimos 20 anos. Para o presidente da Comissão Nacional de Fruticultura da CNA, Tom Prado, os dados “expressam, além da resiliência da produção nacional, a grande importância que esta cadeia produtiva tem no contexto do agronegócio brasileiro”.
Atualmente, toda a produção da matéria-prima do cacau, (as amêndoas secas), é consumida internamente no Brasil. O processo produtivo inclui basicamente quatro agentes:
• A primeira representa a propriedade rural ou unidades de produção de cacau;
• A segunda etapa são os agentes intermediários, definidos como pequenos, médios e grandes compradores.
• A terceira é formada pelas indústrias de processamento de amêndoas secas para produção de pasta, licor, manteiga de cacau, torta e pó;
• E a quarta e última etapa refere-se à indústria chocolateira do país e às vendas dos subprodutos no mercado externo.
Com foco na retomada das exportações, a CNA está finalizando um estudo sobre a “formação do mercado interno do cacau diante da nova perspectiva do Brasil como exportador do produto”, contratado à Universidade Federal de Lavras (UFLA). O trabalho deve contemplar estratégias que potencializem a posição do Brasil como grande produtor de cacau e consumidor de chocolate, além de outras formas que auxiliem às exportações.
A história do cacau no mundo – O mundo civilizado só tomou conhecimento da existência do cacau e de chocolate depois que Cristóvão Colombo descobriu a América. Até então, era privilégio dos nativos que viviam no Sul do México, América Central e Bacia Amazônica, onde o cacau se desenvolvia naturalmente em meio à floresta. Hoje, quase 5 séculos depois, derivados do cacau são consumidos em muitas formas, em praticamente todos os países, e fazem parte da vida do homem moderno.
Foi usado pelos astecas como moeda, provocou discussão entre os religiosos sobre o seu uso nos conventos devido às suas supostas propriedades afrodisíacas e, por muito tempo, foi consumido como bebida exclusiva das mais pomposas cortes da Europa. Suas sementes, levadas para outras regiões e continentes, formaram grandes plantações que, hoje, representam importante fonte de trabalho e renda para milhões de pessoas. Na segunda metade do século XIX, foi levado para a África. As primeiras plantações africanas foram feitas por volta de 1855, nas ilhas de São Tomé e Príncipe, colônias portuguesas ao largo da costa ocidental africana.
O cacau no Brasil, primeiras tentativas no Pará e estabelecimento na Bahia – Oficialmente, o cultivo do cacau começou no Brasil em 1679, com a autorização na Carta Régia para os colonizadores plantá-lo em suas terras. Várias tentativas feitas no estado do Pará para concretizar essa diretriz fracassaram, principalmente, por causa da pobreza dos solos daquela região. Apesar disso, por volta de 1780, o Pará produzia mais de 100 arrobas de cacau. O cultivo, entretanto, não se estabeleceu naquela época e permaneceu uma simples atividade extrativa por longo tempo.
Em 1746, um agricultor da Bahia recebeu algumas sementes de um colonizador do Pará e introduziu o cultivo no estado. O primeiro plantio foi realizado na fazenda Cubículo, às margens do rio Pardo, no atual município de Canavieiras. Em 1752, foram feitos plantios também no município de Ilhéus. O cacau se adaptou bem ao clima e solo do Sul da Bahia, região que produz hoje 95% do cacau brasileiro. Atualmente, o Brasil é 5° produtor de cacau do mundo, ao lado da Costa do Marfim, Gana, Nigéria e Camarões.
Conheça abaixo histórias de produtores de cacau da Bahia e Pará.
BAHIA – Nascido em Salvador, Bahia, Guilherme de Castro Moura faz parte da quinta geração de produtores de cacau do Sul do estado, atuando nos municípios de Camacan e Canavieiras. Para entender melhor essa história, voltemos ao século 19. Em 1824, Leandro Ribeiro, tataravô de Guilherme, recebeu pela luta na independência da Bahia, uma sesmaria – um lote de terra considerado abandonado que era instituído, por lei, para a produção agrícola. Ali, junto com a família iniciou as atividades em Canavieiras, ainda como agricultura de subsistência. Apesar de toda notoriedade de Ilhéus no cultivo do cacau, Canavieiras é considerado o berço da cacauicultura na Bahia.
Na época, o plantio de cacau em Canavieiras sofria uma séria influência do Rio Pardo, que quando enchia alagava as plantações de cacau. Muitas vezes os produtores da região perdiam toda produção por conta desses alagamentos. Anos se passaram e a situação não mudava. Até que João Elias Ribeiro, bisavô de Guilherme Moura, resolveu montar uma expedição para subir o Rio Pardo. A meta era procurar novas áreas para o plantio de cacau. Mas, no dia da expedição ele adoeceu e não pode ir. A missão então ficou para seus filhos que deram sequência à empreitada. Empreendedores, subiram o Rio Pardo, plantaram o cacau nessas novas terras e depois retornaram para Canavieiras. Dez anos se passaram e eles voltaram para ver o resultado da plantação na região acima do Rio Pardo. Lá, uma grata surpresa: o cacau havia florescido. Estava bonito, forte, produtivo. Diante do cenário, a família migrou para essa região e começou o cultivo no lugar. Hoje, as terras desbravadas anos atrás formam o município de Camacan, que chegou a ter maior produção de cacau do estado da Bahia.
Luiz Gonzaga Ribeiro de Moura, pai de Guilherme, deu sequência ao legado da família no interior. Guilherme foi criado em Salvador, onde estudou e se especializou. Estava em Salvador quando o pai e o irmão enfrentaram um dos períodos mais difíceis da história do cacau: a vassoura-de-bruxa, praga que devastou a região e transformou o país em importador do fruto. Quando Guilherme ingressou nos negócios da família, em 2002, a pior parte da “crise da vassoura” já havia passado e a produção do cacau vivia uma fase de retomada. Mas os preços ainda estavam muito defasados, graças ao câmbio muito valorizado e a um mercado internacional muito baixo. Porém, remando na contramão da maior parte dos produtores que se afundaram na crise, a família buscou soluções para os negócios, pelo empreendedorismo: nascia assim, chocolate Costanegro, aliado a outras ações para combater o período conturbado. “Nada como uma boa crise para se buscar alternativas. Foi nesse momento que focamos na produção de cacau e intensificamos as outras atividades que já tínhamos, como pecuária de corte e leite. Ingressamos também no plantio de seringa e, por fim, consolidamos a criação do nosso chocolate”.
Apesar de ter sido iniciado em 2010, o projeto do chocolate só saiu mesmo em 2015. Nesse período foram analisados modelos de negócio e mercados para que o produto chegasse com o nível de excelência que marcou a produção da família ao longo dos anos. E deu certo. Depois de uma fase de crescimento no ano passado, a meta é que 2016 atinja seja o ano da afirmação. Mas Moura pondera que, apesar do sucesso alcançado com a diversificação dos negócios, o cacau continua sendo o legado da família. “O nosso grande negócio continua sendo o cacau. Se o nosso chocolate é diferenciado e já tem reconhecimento no mercado, é graças ao cacau que a gente produz. Ao longo desse tempo aprimoramos a nossa forma de produzir cacau, buscando sempre a excelência que nos rendeu prêmios nacionais e internacionais e eu espero que esse legado continue atravessando as gerações da família”.
PARÁ – Segundo maior produtor do Brasil, no Pará concentra a cultura cacaueira nas regiões do Baixo Tocantins, Sul e Sudeste, Transamazônica e Nordeste. O diretor-geral da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (Camta) – que reúne 166 cooperados em uma região com cerca de mil produtores –, Ivan Hitoshi Saiki, explica que no ano passado foram produzidas cerca de 12 mil toneladas do fruto e aponta algumas conquistas da cooperativa. “O chocolate da Camta foi reconhecido em 2010 como Cacau de Excelência pela International Cocoa Awards, um certificado conferido por gigantes do mercado mundial de chocolates finos e por instituições de referência do setor, como o Salão do Chocolate de Paris, a maior vitrine gastronômica da linha gourmet e de origem”, destaca o produtor.
Origem – Em 1972, Ivan deu continuidade ao cultivo de cacau iniciado por seu pai no estado. Ele conta orgulhoso que o chocolate do Pará já conquistou o mundo. Com um cacau de alta qualidade e uma produção que estimula o desenvolvimento socioambiental, a Camta é referência internacional em Sistema Agroflorestal (SAF) e também possui o título de “Cacau Fino”, cedido pelo festival em 2015, que seleciona as 150 melhores amostras de cacau do planeta. Para Ivan, o diferencial do mercado brasileiro está na preocupação com as questões sociais e ambientais.
“O Salão reúne os principais produtores do cacau. Todos os produtos de lá são muito bons. No entanto, a diferença do fruto produzido aqui, principalmente no Pará, é o que tem por trás da produção. O que ela representa para a sociedade e para o meio ambiente. Lá na África tem mão de obra escrava e infantil. Não se tem noção de sustentabilidade e nem de desenvolvimento social. Comprando desses países, se contribui para a manutenção da pobreza, da miséria e de condições desumanas de sobrevivência. Aqui não, trabalhamos com carteira assinada e não tem criança trabalhando. Isso é sustentabilidade. O cacau é uma cultura que preserva o meio ambiente, a que se pese o Sistema Agroflorestal em que nos tornamos referência. Não é simplesmente um cacau, é um cacau que tem sustentabilidade. Grandes indústrias, principalmente a japonesa, estão vindo comprar aqui no estado por isso”, ressalta.
Quando perguntado sobre as perspectivas para o futuro, o diretor-geral da Camta se revela otimista. “Em Tomé-Açu já está pronto o projeto da nossa fábrica de chocolate e daremos início a capacitação de técnicos e produtores, que é um dos caminhos para garantir a qualidade da produção de cacau e de chocolate fino. A produção artesanal de bombons, ovos de páscoa e outros doces de chocolate é um dos nossos focos”, finaliza Ivan Saiki.