19/09/2016 – Grupo Cultivar
Autores: Simone Rodrigues da Silva, Ricardo Bordignom Medina, Katia Fernanda Dias Rodrigues, Tatiana Cantuarias Avilés
Há vários tipos de mirtilo. Os do grupo lowbush englobam arbustos de porte baixo, com no máximo 50 centímetros de altura e alta exigência em frio (aproximadamente 650 horas a 850 horas anuais abaixo de 7,2ºC). Já no grupo highbush, os arbustos chegam a até dois metros de altura e apresentam alta exigência em frio (entre 650 horas a 850 horas anuais). Dentro deste grupo, há um subgrupo chamado Southern highbush representado por plantas altas, de pouca exigência em frio, produtivas, de maturação precoce e colheita mais concentrada. O grupo dos mirtileiros do tipo Rabbiteye, ou “olho de coelho”, abrange plantas entre dois metros e quatro metros de altura, com baixa exigência em frio, entre 300 horas e 400 horas.
As variedades mais plantadas no Brasil são Aliceblue, Bluebelle, Bluegem, Briteblue, Climax, Delite, Powderblue e Woodard do grupo Rabbiteye, e Misty, O’Neal e Georgiagem do tipo Southern highbush, mas deixaram de ser plantadas em países do hemisfério Norte por apresentarem menor produtividade, produção tardia, colheitas longas e inferior qualidade de frutos.
As novas variedades do grupo Southern highbush: Star, Jewel, Emerald, Millenia, Primadonna e Snowchaser que foram desenvolvidas pela Universidade da Flórida vêm sendo introduzidas no Brasil com o objetivo de substituir gradativamente o cultivo das variedades antigas. A principal vantagem destas variedades é que sua produção é possível em locais de baixa incidência de frio hibernal, o que permite ampliar as regiões de cultivo de mirtilos no Brasil.
Quando se pretende instalar uma nova área de produção, deve-se levar em consideração não só o potencial da variedade a ser implantada, mas também a qualidade das mudas que serão utilizadas no plantio.
A produção de mudas de mirtilo é feita utilizando-se um método de propagação muito conhecido, o da estaquia, que consiste em enraizar partes da planta, principalmente ramos, retirados de uma planta matriz que represente a variedade em termos de potencial produtivo e boa sanidade. Utilizam-se estacas herbáceas de 10cm a 15cm, que possuam tecidos tenros e de coloração verde e que são retiradas da parte apical dos ramos no período de primavera/verão, épocas em que ocorrem fluxos de crescimento vegetativo. Como esse material é muito sensível à desidratação, faz-se a coleta preferencialmente na parte da manhã, deixando-se pelo menos um par de folhas, que será responsável pela continuação do processo fotossintético que fornecerá fotoassimilados tanto para a manutenção da estaca, quanto para a formação das raízes.
Estacas semilenhosas e lenhosas também podem ser utilizadas na produção de mudas de mirtilo, devendo ser obtidas de ramos parcialmente ou totalmente lignificados. Recomenda-se retirar essas estacas no período de repouso vegetativo, sendo obtidas do material descartado pela realização da poda de inverno. Apenas as estacas semilenhosas devem permanecer com um par de folhas.
Após a coleta das estacas da planta matriz faz-se o seu preparo, colocando-as para enraizar em substrato adequado que possua boa capacidade de retenção de água, drenagem satisfatória e esteja livre de patógenos de solo, planta daninha e nematoide. No Brasil, o principal substrato utilizado para o enraizamento dessas estacas é areia e no Chile utiliza-se uma mistura de turfa (50%) e perlita (50%). Nessa etapa é importante garantir que o substrato possa aderir bem à estaca. Então, se faz uma leve compactação do substrato ao redor das estacas, para evitar a permanência de bolsões de ar na sua base.
Reguladores vegetais, principalmente as auxinas sintéticas, são muito utilizados para auxiliar o enraizamento e, por apresentarem difícil diluição em água, podem ser dissolvidos em solução de álcool ou de hidróxido de potássio para serem aplicados na forma líquida ou misturados em talco para aplicação em pó. Estacas herbáceas de mirtilo devem ser tratadas com ácido indolbutírico (AIB) na concentração de 2.000mg/l a 2.500mg/l.
Depois de prontas, as estacas são levadas para ambientes propícios ao enraizamento. Estacas herbáceas e semilenhosas devem ser colocadas em uma câmara de nebulização intermitente, que permita a emissão de pequenas gotículas de água no ambiente, de tempo em tempo, mantendo molhada a superfície das folhas. Esse ambiente é propício ao enraizamento, pois evita a desidratação e o encharcamento das estacas. No caso das estacas lenhosas, essas instalações não são necessárias, podendo ser colocadas em canteiros de areia ou saquinhos contendo substrato em ambiente coberto com no máximo uma tela de sombreamento, para evitar os efeitos do excesso de radiação solar e chuva.
Após um período de aproximadamente 90 a 120 dias, as estacas devem ser retiradas do ambiente de enraizamento e transplantadas para sacos plásticos de três a quatro litros, colocados em ambiente coberto por plástico ou sombrite. No Brasil utiliza-se como substrato a casca de pínus e no Chile emprega-se uma mistura de 2/3 de acícula de pínus (folha do pínus) misturado com 1/3 de serragem de pínus. É comum cobrir o solo do interior do viveiro com lona plástica para evitar competição com plantas daninhas. As mudas irão se desenvolver e quando estiverem com aproximadamente 12 meses, poderão ser comercializadas. Alguns viveiristas fazem o rebaixamento das mudas a uma altura de 20cm antes de enviá-las ao produtor, prática recomendada para formação da planta tanto em plantios de campo como em vasos ou sacolas plásticas. As etapas para a produção de mudas de mirtilo utilizando estacas herbáceas estão ilustradas na Figura 1.
As mudas de mirtilo também podem ser obtidas pela propagação in vitro ou micropropagação, que consiste na aplicação da técnica de cultura de tecidos para a produção de plantas idênticas a planta matriz. Este tipo de propagação permite produzir muda com alta qualidade genética e fitossanitária. É feita em laboratórios a partir de pedaços de tecido vegetal. Estes fragmentos retirados de vegetais são chamados de explantes e multiplicados em meio de cultura artificial (sem solo), que fornecem nutrientes e outras substâncias necessárias à multiplicação e regeneração de novas plantas. As técnicas de propagação in vitropermitem a produção de um grande número de plantas a partir de um único explante, em menor tempo, além de possibilitar também a produção de mudas livres de patógenos causadores de doenças que pelos métodos de propagação convencionais, podem ser transmitidos pelas mudas.
Primeiro, obtêm-se os explantes que devem permanecer no meio de cultura por um período de dois a três meses. Em seguida, esses explantes são retirados do meio e colocados em estruturas especiais para aclimatação, para desenvolver raízes e folhas, durante três a quatro meses. Após esse período, são obtidas pequenas plântulas de 10cm a 15cm de comprimento, com poucas raízes e aproximadamente dois a quatro brotos, que serão transplantadas para saquinhos plásticos contendo substrato até atingir a altura de 40cm-50cm onde estarão prontas para serem plantadas no campo.
As mudas representam hoje 27% dos custos de implantação de um pomar de mirtilos, já consideradas as variedades antigas. Esses custos aumentam para 42% se as mudas forem oriundas das variedades obtidas pelo Programa de Melhoramento da Flórida.
A qualidade das mudas é fundamental para o sucesso do negócio e o Brasil possui enorme potencial para o desenvolvimento da cultura considerando as condições ambientais favoráveis que permitem a produção de frutos na entressafra do Hemisfério Norte, além da disponibilidade de água, a presença de solos ácidos exigidos pela cultura, a menor distância aos mercados compradores da Europa em relação aos concorrentes da América do Sul e a tendência mundial de aumento do consumo de mirtilos.
Cultivo do mirtilo – O mirtilo (Vaccinium spp.) é uma espécie frutífera originária dos bosques “temperados” da América do Norte, bem como de regiões do norte da Europa. Além do sabor exótico, o fruto contém antocianinas e polifenóis, antioxidantes naturais que auxiliam na prevenção do câncer, doenças cardiovasculares, doenças da visão como cataratas e degeneração macular, além de promover melhorias na circulação sanguínea e, consequentemente, em problemas como hemorroidas, varizes, edemas e feridas. Por suas propriedades, o mirtilo é também conhecido como a fruta da “longevidade”.
A produção mundial de mirtilo tem crescido a cada ano, devido principalmente às suas propriedades funcionais e nutracêuticas. Estima-se que o volume de produção mundial gire em torno de 331 mil toneladas em uma área de 74 mil hectares. Destaque para os Estados Unidos e Canadá que juntos respondem por aproximadamente 83% da produção e também para a Alemanha e a Polônia, na Europa, e Chile e Argentina, na América do Sul.
Embora o Brasil importe 90% dos mirtilos que consome, possui um grande potencial de crescimento principalmente por produzir na entressafra do Hemisfério Norte, o que garante a rentabilidade dos produtores que buscam diversificar seus pomares. Além disso, a introdução de variedades obtidas do Programa de Melhoramento Genético da Universidade da Flórida, com menor exigência em frio e colheita precoce, entre os meses de outubro e novembro, garante os melhores preços de mercado, por não haver nesse período oferta de fruta de outros países do Hemisfério Sul.
No Brasil, o mirtilo é produzido nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais e embora não haja dados oficiais, estima-se que a área plantada seja de 250 hectares, com plantações pequenas, menores que dois hectares.