Henrique Pessoa dos Santos e Lucas Garrido*
A primavera, pelo fato de ser uma estação de transição, caracteriza-se por grandes variações de temperatura, de frequência e intensidade de chuvas, de insolação. Como consequência, nestas condições podem ocorrer facilmente eventos meteorológicos extremos, como a ocorrência de ventos fortes, de granizo e geadas tardias. No caso específico do granizo, cuja previsão é impossível de ser feita, os danos poderão ser severos e prejudicarem a planta tanto na safra do ano corrente quanto nas safras seguintes. Confira as orientações repassadas pelos pesquisadores Henrique Pessoa dos Santos e Lucas Garrido, da Embrapa Uva e Vinho.
Dentro das ações de prevenção que podem ser adotadas, destacam-se as telas antigranizo e as coberturas com plástico tipo ráfia, os quais são mais resistentes. Contudo, esses investimentos são viáveis somente em regiões muito propícias à ocorrência de granizo e com uvas que apresentam maior valor agregado de comércio (ex.: uva de mesa).
Quando a propriedade não dispõe de nenhum método de prevenção dos danos por granizo, as recomendações de manejo de recuperação das videiras irão depender do grau de danos que o vinhedo sofreu. Portanto, é muito importante o produtor inspecionar a área e os danos às plantas o mais rápido possível após um evento de granizo, pois o nível de dano pode ser obscurecido pelo crescimento subsequente. Portanto, produtores com seguro agrícola devem sempre contatar sua seguradora e providenciar a avaliação de danos o mais breve possível, para obter uma análise mais fidedigna possível. Salienta-se que a avaliação também não pode ser tão antecipada (ex.: no dia do evento), pois a maioria dos sintomas de lesão por granizo se manifestam geralmente após 3 dias do evento.
Dependendo do momento do evento, o granizo pode afetar a folhagem, as flores, os caules, os ramos e a uva de várias formas:
→ As folhas podem ser arrancadas, rasgadas e furadas, restringindo a funcionalidade das mesmas e abrindo portas para incidência de doenças fúngicas;
→ Brotos e troncos podem ser quebrados ou machucados na casca, favorecendo doenças;
→ As flores podem ser derrubadas ou danificadas, no entanto, a extensão total deste dano pode não aparecer até que as inflorescências sejam totalmente expandidas (quando a chuva ocorre no período entre a brotação e a floração).
→ Os cachos de uva podem ser machucados na casca ou derrubados no chão, impactando na qualidade, em função do apodrecimento e da redução na produção.
Embora esses danos possam ser extremos e com perdas totais de produção, as plantas de videira geralmente conseguem se recuperar e sem muito impacto para o próximo ciclo, se os danos ocorrerem no início do ciclo de crescimento. De qualquer forma, salienta-se que nas áreas afetadas por granizo, todas as ações serão paliativas ou curativas, visando, principalmente, a recuperação e o preparo das plantas para os ciclos seguintes. As lesões por granizo no início da estação, logo após a brotação, permitem que ainda ocorram brotações férteis, a partir das gemas que permaneceram latentes, e com efeito mínimo sobre a fertilidade ou a colheita na estação seguinte. Algumas cultivares, como Cabernet Sauvignon, dispõem de gemas secundárias latentes relativamente férteis e podem até garantir alguma brotação secundária com cachos após danos por granizo. Contudo, a maioria das cultivares são menos férteis e podem perder totalmente a produção do ciclo. Além disso, se os danos por granizo ocorrerem em uma época mais tardia (ex.: após a floração), podem reduzir a fertilidade das gemas, comprometendo a colheita na estação seguinte.
O granizo pode também causar lesões que prejudicam as videiras novas, em áreas ainda em formação (plantios jovens). Se os brotos que se estendem até o fio de produção estiverem muito marcados, recomenda-se cortá-los abaixo dos ferimentos para induzir uma nova brotação. Se isto não for considerado, a cicatrização das lesões neste broto, que eventualmente será um tronco, poderá ter problemas no fluxo de seiva para parte aérea, além de abrir pontos de entrada para as doenças de tronco.
Outro detalhe importante sobre o granizo é o aspecto sanitário das videiras. As plantas danificadas tornam-se muito mais suscetíveis às pragas e doenças. A podridão de Botrytis pode infectar qualquer tecido danificado se as condições climáticas estiverem favoráveis. Portanto, é de extrema importância o uso de tratamentos para proteger as lesões, imediatamente após o granizo.
Manejo em áreas com fortes danos: Nesse caso, quando ocorrem perdas próximas a 100%, os produtores deverão efetuar uma poda de formação/produção igual à efetuada no inverno. A seguir, devem efetuar a aplicação de fungicidas de contato, para a proteção e cicatrização dos ferimentos. Também é recomendado aplicar fungicidas para a cicatrização dos ferimentos nas brotações novas, tais como tiofanato metílico (cercobin), folpet (Folpan), dithianon (Delan), tebuconazole (Folicur) e captan (Orthocide). É necessário realizar a adubação nitrogenada para favorecer as novas brotações e o acúmulo de reservas, pensando na próxima safra. Caso já tenha sido feita a adubação nitrogenada antes do granizo, não há necessidade de repeti-la.
Manejo em áreas com danos moderados: Em vinhedos que apresentaram menor intensidade de dano, a recomendação fica centrada na aplicação de fungicidas de contato, para proteção dos ferimentos, sem a necessidade da repoda.
Obs.1: Tanto em caso de danos fortes ou de danos moderados, sempre é importante a manutenção de pulverizações com fungicidas nos vinhedos até o fim do ciclo, para que as plantas possam manter as folhas e as novas brotações com boa sanidade para o acúmulo de reservas para os ciclos seguintes. Se isso não for mantido, a videira irá apresentar variabilidade na maturação e fertilidade das gemas e no nível de dormência, prejudicando a brotação, o vigor e o potencial de produção do ciclo seguinte. Além disso, o descaso no manejo das áreas pós granizo, poderá também favorecer os problemas de declínio e morte das plantas, restringindo a vida útil dos parreirais.
Obs.2: Quando videiras (Vitis vinifera ou qualquer outra espécie de Vitis spp.) são expostas a chuvas de granizo, ferimentos são abertos nos tecidos dos ramos e tronco, favorecendo a infecção de fungos causadores do declínio e morte de plantas, entre eles destacam-se: Botryosphaeria spp.; Eutypa lata, Phaeoacremonium spp, Phaeomoniella spp., entre outros. Essas espécies de fungos são frequentemente encontrados no ambiente dos vinhedos e pomares e o controle se dá pela retirada de restos culturais contaminados e o tratamento dos ferimentos com fungicidas. Portanto, recomenda-se que após chuvas de granizo seja realizada imediatamente a aplicação de duas pulverizações com fungicidas de contato para a proteção dos ferimentos, enquanto ocorre a cicatrização, com intervalo de aplicações de 7 a 10 dias. Os produtos recomendados são produtos à base de cobre, mancozeb ou captan. Ramos severamente lesionados devem ser podados e os ferimentos da poda devem ser igualmente tratados para evitar infecções fúngicas. Após esses tratamentos dos ferimentos deve-se continuar com as pulverizações visando o controle das doenças da parte aérea, para que a planta possa se recuperar do estresse sofrido e acumular reservas (carboidratos) no tronco e nas raízes, além de alguma adubação. A manutenção da sanidade da planta e o acúmulo adequado das reservas permitirão o restabelecimento do crescimento e a produção na safra seguinte. Por outro lado, o não tratamento dos ferimentos e a falta de cuidado em manter a sanidade da vegetação da planta acarreta em seu declínio e morte.
*Pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho
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