Após três anos de estudos e pesquisas, um produtor do médio-norte de Mato Grosso conseguiu na safra passada carregar seu pulverizador terrestre com um pesticida biológico – fabricado por ele mesmo – para controlar as pragas nas lavouras de soja e milho. Na estrutura da multiplicação on farm, como é conhecida a produção dentro da fazenda, ele investiu em 28 tambores e reatores.
“Fui motivado pela queda na eficiência dos inseticidas químicos, que têm um custo cada vez mais alto. O insumo biológico é uma excelente ferramenta de controle. Além do custo menor, reduzo o uso de pesticidas”, diz o produtor, que não quer se identificar para não ficar “marcado”.
A prática não é ilegal. Os produtores se amparam na Lei dos Orgânicos, que permite a produção de insumos agrícolas para uso próprio. Mas o caso evidencia alguns aspectos do mercado de biodefensivos, que utilizam organismos vivos como bactérias, fungos, vírus ou insetos para suprimir a população de uma praga específica, tornando-a menos abundante ou menos danosa.
Nas últimas safras, os danos causados pela lagarta Helicoverpa armigera em lavouras de soja e algodão e a resistência da lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda) à tecnologia do milho Bt acenderam o sinal de alerta, despertando o interesse pelos biológicos. Os agricultores passaram a demandar cada vez mais esses produtos, a ponto de começarem a formulá-los na própria fazenda.
Segundo a Associação Brasileira de Biodefensivos Agrícolas (ABCBio), o mercado brasileiro de biológicos movimenta R$ 500 milhões. As vendas triplicaram nos últimos cinco anos, ao mesmo tempo em que o setor de agroquímicos recuou 22% no período.
ABCBio engloba 23 empresas do setor – sejam químicas ou apenas biológicas. De acordo com a associação, a queda nas vendas de agrotóxicos pode ser atribuída à diminuição de lançamentos pela indústria, à resistência de pragas e doenças às moléculas químicas, à pressão pelo menor uso de agrotóxicos em culturas alimentícias e às novas tecnologias, como a biotecnologia de sementes, além dos próprios biodefensivos.
Uma pesquisa realizada pela ABCBio em parceria com a consultoria Informa Economics FNP revelou que, de 2016 para 2017, o uso de biodefensivos aumentou 25% por hectare no Brasil. O estudo aponta que usuários apostam no crescimento da demanda nos próximos anos.
Segundo a entidade, além dos produtos registrados no Ministério da Agricultura, o mercado de biológicos é composto por biodefensivos sem registro, biodefensivos registrados como fertilizantes e biodefensivos caseiros.
O Ministério da Agricultura (Mapa) diz não ter como regulamentar a produção on farm. De acordo com o diretor de insumos agrícolas da pasta, André Peralta, o problema é que não há critérios mínimos estabelecidos para a fabricação. “Devem existir regras, padrões mínimos, mas não cabe ao ministério legislar sobre uso próprio”, diz, lembrando que a Embrapa vem trabalhando na padronização.
O presidente da ABCBio, Gustavo Hermann, lembra que o mercado nasceu na informalidade. Por isso surgiu a associação, em 2007. Para se associar, a empresa precisa ter registrado ao menos um produto biológico como defensivo. “Existem outros biológicos no mercado, como inoculantes, que são bactérias fixadoras de nitrogênio. Ou seja, são organismos biológicos, mas não são de controle”, diz.
Fonte: Globo Rural 09 de janeiro de 2019, por Vinicius Galera.