Autoria: M. Francisca Canovas de Moura (Embrapa Uva e Vinho) – fevereiro/2019
A Embrapa Uva e Vinho lançou duas novas cultivares de uva: a BRS Melodia, uva rosada de mesa sem sementes, e a BRS Bibiana, uva para elaboração de vinho branco, com alto grau de açúcar, resistente a doenças e alta produtividade, chegando a 25 toneladas por hectare. Ambas cultivares são adaptadas ao clima temperado do sul do País e demandam menor quantidade de insumos para o controle de doenças quando comparadas a outras cultivares com a mesma finalidade.
Foto: João Henrique Figueiredo – BRS Melodia
Além dessas duas novidades, a Embrapa apresentou as recomendações de cultivo na Serra Gaúcha das cultivares de uva de mesa sem sementes BRS Isis e BRS Vitória, que foram desenvolvidas inicialmente para produção em regiões de clima tropical, com destaque para o Vale do São Francisco (PE/BA). Na Serra Gaúcha, a principal recomendação para as três cultivares de mesa, BRS Isis, BRS Vitória e BRS Melodia, é o cultivo sob cobertura plástica.
Para Mauro Zanus, chefe-geral da Embrapa Uva e Vinho, “esses dois lançamentos estão associados ao estágio de amadurecimento do Programa de Melhoramento Genético da Empresa, que foi constituído há muitos anos com o Banco Ativo de Germoplasma (BAG Uva). Hoje nós temos uma coleção de trabalho com as melhores seleções e cultivares que fornecem material para os cruzamentos, atribuindo características interessantes, por exemplo, a resistência às doenças, características do cacho, cor, aroma e sabor das uvas. Com isso, conseguimos oferecer de forma permanente novas cultivares para atender as demandas do setor”.Aproximadamente 120 pessoas, entre viticultores, técnicos e lideranças do setor estiveram presentes no lançamento da ‘BRS Melodia’ e apresentação de manejo da ‘BRS Vitória’ e ‘BRS Isis’, quando puderam conhecer os resultados das pesquisas desenvolvidas pela Embrapa em Bento Gonçalves.
Umberto Camargo, pesquisador aposentado da Embrapa e responsável pela criação do Programa de Melhoramento Genético Uvas do Brasil, destacou a importância de divulgar, junto com os lançamentos, as recomendações de cultivo. “Eu já vi produtores implantarem áreas de BRS Vitória e, no segundo ano de cultivo, decidirem eliminar o vinhedo. Atribuo isso principalmente à falta de conhecimento do manejo da nova cultivar, que é muito boa mas, se for mal manejada, poderá ser considerada como uma variedade sem qualidade ou com defeitos graves”, explica Camargo.
BRS Melodia, uva rosada sem sementes cultivada sob cobertura plástica
A BRS Melodia é uma cultivar de uva híbrida, com boa tolerância às doenças da videira, principalmente ao míldio e ao oídio. Foi criada especificamente para consumo in natura, com destaque para sua cor rosada bastante intensa e ao sabor tutti-frutti. Quanto à textura, é uma uva crocante e de casca fina, tornando-a uma uva fácil de mastigar. A BRS Melodia se adaptou muito bem à Serra Gaúcha sob cobertura plástica, região onde esse tipo de cultivo tem aumentado.
Produtores se interessam pela cultivar BRS Melodia
O produtor de uvas de mesa de Alto Feliz (RS) Jair Fernando Freiberger gostou dos lançamentos. “São uvas muito bonitas, vistosas as quais acredito que futuramente terão potencial para atingir grandes mercados também”, disse.
Produtores de outras regiões também se interessaram pela nova cultivar, como Sergio Eiti Iida de Pirapora (MG). Lá, a família cultiva 130 hectares de uva Niágara, além de uma pequena área de ‘BRS Isis’ e ‘BRS Vitória’. “Ficamos bastante interessados na ‘BRS Melodia’ e, pelo o que degustamos, com certeza essa uva saborosa tem um grande potencial de aceitação no mercado”, afirmou
Vilmar Capellaro, atual prefeito de Lagoa Grande (PE), no Vale do São Francisco, produz as cultivares BRS Vitória, BRS Isis, BRS Núbia e BRS Clara, numa área de 110 hectares e vê na sua região, que tem em torno de 1500 produtores assentados pelo Incra às margens do Rio São Francisco, um grande potencial para a viticultura de mesa. Integrante da Câmara de Fruticultura na região do Vale do São Francisco, Capellaro acredita que “o País, especialmente o Vale do São Francisco, deve investir mais em tecnologia nacional, para que o conhecimento aqui gerado fortaleça tanto o mercado interno quanto as exportações; esse é um exemplo prático do potencial que a ‘BRS Melodia’, pode alcançar como está sendo com a ‘BRS Vitória'”.
BRS Bibiana, cultivar de uva para elaboração de vinho branco
A ‘BRS Bibiana’ é uma uva branca, resistente às podridões de cacho, pois eles não são compactos. O vinho elaborado com a ‘BRS Bibiana’ remete àqueles obtidos a partir de uvas europeias. O nível de açúcar, na maturação, é alto, em torno de 21 ºBrix, com acidez em torno de 100 a 120 mEq/litro. A nova cultivar se adapta melhor ao clima subtropical úmido da região da Serra Gaúcha, tem alta produtividade e demanda menos tratamentos fitossanitários por sua resistência genética e dos cachos soltos.
Para Mauro Zanus, a ‘BRS Bibiana’ “é a matéria-prima mais adaptada às condições de solo e clima da Serra Gaúcha para a elaboração de um vinho branco com todas as características de um vinho fino”.
Vinicultores e enólogos se surpreendem com a ‘BRS Bibiana’ e seu vinho
O engenheiro agrônomo da Cooperativa Vinícola São João, Paulo Adolfo Tesser, acredita que a ‘BRS Bibiana’ é uma variedade com qualidade superior às uvas viníferas da região. “O mais importante é o aroma dela, parecido com o das uvas tipo Sauvignon Blanc e Chardonnay. Também é uma uva mais fácil de produzir e resistente às podridões de cacho e outras doenças, bastante importante nessa região que é chuvosa”.
Thompson Benhur Didoné, extensionista da Emater/RS-Ascar não conhecia a nova cultivar de vinho branco e concorda com Tesser. “Só a redução na aplicação de defensivos, devido à resistência principalmente às podridões, já é um ganho para o produtor que reduz o custo de produção e também em termos ambientais”. Ele também se surpreendeu com o vinho: “extremamente elegante, com toda a semelhança às viníferas, embora classificada como híbrida, tendo uma acidez equilibrada”. Para ele é um vinho com grande potencial.
Flávio Ângelo Zílio, enólogo da Cooperativa Vinícola Aurora chega a fazer um pedido para quem degustar o vinho da ‘BRS Bibiana’: “avaliem essas variedades com muito carinho, porque elas são originárias de muito trabalho e têm provado sua qualidade. Precisamos respeitá-las e divulgá-las pelo Brasil, para que possamos tomar vinhos cada vez mais saudáveis e de qualidade”.
Para Humberto Camargo, o vinho da ‘BRS Bibiana’ é muito peculiar, com aroma frutado, que lembra goiaba, tem terpenos de alta qualidade e pode concorrer em avaliações sensoriais de vinhos em qualquer parte do mundo. “Creio que é uma oportunidade que a Serra Gaúcha e a vitivinicultura brasileira têm para consagrar definitivamente um produto genuinamente brasileiro.”
“O Programa de Melhoramento Genético Uvas do Brasil é feito em conexão com o setor produtivo, observando suas demandas e gerando soluções tecnológicas nacionais. Nem todos os países têm à sua disposição esses avanços, introduzidos aos poucos por uma equipe de pesquisadores e técnicos,que agora conseguem disponibilizar, em sintonia com os desafios da Embrapa, inovações no setor produtivo, a fim de manter a competitividade do setor”, conclui Mauro Zanus.
‘BRS Isis’ e ‘BRS Vitória’ adaptadas às condições de solo e clima da Serra Gaúcha
As cultivares de uva BRS Isis e BRS Vitória, desenvolvidas para cultivo em regiões tropicais, tiveram seu manejo adaptado ao clima temperado da Serra Gaúcha, sob cobertura plástica.