A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) está apresentando uma nova cultivar de uva, a BRS Núbia, uva preta de mesa com sementes. Cerca de cem viticultores e técnicos de diversos municípios paulistas puderam conhecê-la em tarde de campo realizada dia 26 de julho [de 2013], em Jales (SP).
A nova variedade tem entre seus principais atributos a necessidade de menor mão de obra no cultivo e sua uniformidade de cor, destaca o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho João Dimas Garcia Maia, um dos coordenadores do Programa de Melhoramento Genético de Uva da Embrapa – no âmbito do qual a BRS Núbia foi desenvolvida. Em relação ao primeiro aspecto, ela tem como característica principal o fato de demandar menos mão-de-obra para manejo do cacho. Quanto à cor, sob condições de clima quente (subtropical, tropical úmido ou semiárido), para as quais é indicada, a nova cultivar expressa bem a coloração preta, apresentando uma uniformidade apreciada pelo consumidor.
Em tal sentido, a BRS Núbia coloca-se como uma importante evolução na produção nacional de uva preta de mesa com sementes. Até o momento, anota Dimas, a única cultivar desse tipo produzida em maior escala no país é a Brasil, uma mutação genética espontânea a partir da variedade Benitaka. A Brasil, porém, apresenta pouca expressão de cor quando a maturação coincide com épocas com altas temperaturas e em produtividades elevadas, condições sob as quais sua coloração fica em um meio-termo entre o preto e o vermelho. Afora isso, o cultivo dela exige grande mão-de-obra para manejo do cacho.
A BRS Núbia resolve os aspectos deficitários da Brasil e vai além.
A pesquisadora Patricia Ritschel, coordenadora do Programa de Melhoramento Genético de Uva junto de Dimas, ressalta que o grande tamanho de baga da nova cultivar (outro item considerado importante pelo mercado), com média de 24 milímetros por 34 milímetros, é obtido sem a utilização de reguladores de crescimento, como as giberelinas. Ou seja, a opulência das bagas de BRS Núbia alinha-se à perspectiva de produção mais sustentável.
A nova cultivar destaca-se, ainda, pelos índices de substâncias benéficas à saúde (confira mais abaixo), pelo fato de apresentar ciclo mais curto do que a Brasil – o que resulta também em economia na aplicação de fungicidas – e pela boa aptidão para conservação pós-colheita.
A BRS Núbia foi testada em áreas de validação em Jales (noroeste paulista), Petrolina (PE, no Vale do Submédio São Francisco), Marialva (norte do Paraná) e Jaíba (norte de Minas Gerais), em propriedades de produtores e empresas parceiros. Pelo bom desempenho observado, é recomendada para todas essas regiões. Ela é resultante do cruzamento entre as cultivares Michele Palieri e Arkansas 2095, realizado em 2000, em Bento Gonçalves (RS).
Nova variedade aprovada
A BRS Núbia já despertou atenção.
O engenheiro agrônomo Nedson Aparecido Ignácio da Silva, assistente agropecuário da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) de Marinópolis (SP), gostou do que viu na tarde de campo de apresentação da nova cultivar. “Vejo grande potencial nela, que tem chance real de ‘emplacar’, vindo a substituir a Brasil”, diz Silva. Isso, na avaliação dele, pela coloração “bastante atrativa” da BRS Núbia – enquanto “a Brasil gradualmente vem perdendo cor, a qual é uma característica de que o mercado gosta”. O “sabor excelente, muito marcante” e as informações dando conta do ciclo menor da variedade e de sua maior tolerância ao míldio (dado apontado pelo produtor Paulo Siney Higa, no sítio de quem foi feita a tarde de campo) são outros elementos destacados pelo agrônomo. Silva afirma que os dois produtores de Marinópolis que acompanhou na apresentação interessaram-se efetivamente pela nova cultivar, tendo adiantado-lhe que vão implantá-la.
O produtor Paulo Siney Higa, 70 anos, parceiro da Embrapa no processo de avaliação da BRS Núbia – posto que cedeu, em sua propriedade, em Jales (SP), área para testes de validação da variedade – vê nela uma possibilidade para manter-se na viticultura. O contexto: com o retorno de filhos e sobrinhos para o Japão, nos últimos anos, reduziu-se mais do que pela metade a disponibilidade de mão-de-obra no Sítio Irmãos Higa, no qual trabalham Paulo, sua esposa, Cecília, o irmão dele, Luiz, e esposa, Maria, e o filho deste casal, Luiz Jr.. Por conta disso, os vinhedos, de uvas de mesa (BRS Linda, Benifuji e, hoje, BRS Núbia), passaram de seis para apenas um hectare. “Como estamos envelhecendo, portanto com a capacidade de trabalho diminuindo, enxergamos na BRS Núbia, que demanda menos mão-de-obra e tem custo de cultivo menor, uma alternativa para continuarmos com a produção de uva”, diz Higa. Ele salienta que a cultivar apresenta um aspecto visual bonito e bom sabor, o que aumenta as possibilidades de ganhar espaço no mercado. Uma maior tolerância às doenças do míldio e do oídio em relação a outras uvas cultivadas no sítio – e, em uma safra mais seca, também uma ocorrência mínima de podridão dos cachos causada pelo fungo Botrytis – são outras características da BRS Núbia observadas pelo produtor desde a implantação dos vinhedos da variedade, há dois anos. Estudos estão sendo conduzidos pela Embrapa para verificação das observações.
Presença de substâncias benéficas à saúde
Os atributos da BRS Núbia passam também pela maior presença de substâncias benéficas à saúde. Em comparação à Benitaka, a nova variedade da Embrapa apresenta um teor de antocianinas totais cinco vezes maior e um Índice de Polifenóis Totais (IPT) aproximadamente 60% maior. Os níveis das substâncias foram determinados na película de uvas das duas cultivares produzidas no norte do Paraná. Atribui-se o maior teor de antocianinas à cor mais escura e uniforme da nova cultivar.
Outras características
A BRS Núbia apresenta, ainda:
– cachos médios (450 gramas, em média);
– ciclo médio;
– planta vigorosa;
– produtividade entre 25 e 30 toneladas por hectare;
– sabor neutro;
– textura firme;
– teor de açúcar entre 16° e 20° brix;
– intensa camada de pruína (cera) na casca;
– boa fertilidade.
Sanidade do material
A cultivar BRS Núbia foi testada para detecção de infecções virais. Nesse processo de indexação foram considerados alguns dos principais vírus que compõem as doenças do ‘enrolamento da folha’ e do ‘complexo rugoso’ da videira. Os testes diagnósticos foram baseados na técnica de hibridização molecular. A metodologia é muito sensível e permite detectar o ácido nucleico viral em plantas infectadas, as quais são descartadas do processo de formação de material propagativo de sanidade superior. Assim, somente as plantas identificadas como sadias foram usadas como matrizes para obtenção do material propagativo da BRS Núbia.