(matéria baseada em texto publicado originalmente no site Notícias Agrícolas em 26 de novembro de 2019)
O greening é a mais grave doença da citricultura. Até agora a ciência não encontrou uma solução contra os danos causados por colônias de bactérias que interrompem a circulação da seiva das árvores e levam à sua morte. Até o momento, conseguiu-se apenas saber que ela é transmitida por um vetor, o psilídeo, pequeno inseto que habita os brotos das laranjas – e que é de difícil controle.
Os pesquisadores já sabiam dessa dificuldade desde quando se puseram a combater outro pequeno inseto que voa pelos pomares: a cigarrinha, vinda dos pastos. Com a cigarrinha, chegaram à origem de outra doença da laranja, a CVC (clorose variegada dos citros) ou “amarelinho”. Aprenderam que a Xylella, a bactéria que provoca a doença, é transmitida pela mandíbula do inseto. A cada picada, sua saliva transmite a bactéria.
No entanto a CVC e outras doenças bacterianas que afetam os pomares – como o cancro cítrico – são consideradas problemas menores perto do greening. Depois de dizimar os pomares do centro do estado de São Paulo, a doença se instalou nos pomares da Flórida, nos Estados Unidos, ameaçando a sobrevivência da cadeia de negócios do suco de laranja. Em termos de severidade, o cancro cítrico pode ser considerado como um “câncer leve” dos pomares; já o greening é a “aids” da citricultura.
O manejo do greening custa de 5% a 10% do custo total de produção dos pomares, o que representa em média R$ 845,00 por hectare de laranjas. Quando o greening se instala em 60% da planta, a produção da laranjeira já sofreu uma queda de produtividade de aproximadamente 70%.
Desobstrução de floemas
Pesquisadores do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), liderados pela Dra. Alessandra Alves de Souza, começaram a procurar outro caminho. Entre erros e poucos acertos, a pesquisadora Alessandra procurou uma solução humana. Observou que as pessoas, principalmente as crianças, ao ficarem com seus narizes entupidos, sofrem queda de resistência contra o ataque de bactérias e registram aumento de stress. Ou seja, ficam mais doentes. Solução? Desobstruir as narinas.
A pesquisadora concluiu que as laranjeiras precisavam ter desobstruídos seus floemas, os pequenos vasos que circulam pelas laranjeiras, principalmente nas folhas – pois é por ali que as plantas respiram. Mas com qual produto? A solução veio de um aminoácido, o NAC (abreviatura de acetilcisteína).
Nos humanos, a acetilcisteína é indicada como expectorante quando o bebê (e adultos também) tem dificuldade para expectorar, causada por bronquite, enfisema pulmonar ou pneumonia, resultando na inflamação dos pulmões e brônquios. Na laranjeira, o greening causa problema similar, redundando na morte da planta.
A molécula do NAC trouxe outro benefício para os vasos entupidos pelo greening: rejuvenesceu os floemas, graças à eliminação dos radicais livres. A laranjeira se desestressou. E, como os humanos, passou a ter uma cor mais viva, com cobertura vegetal mais limpa. Com passagem livre para água e nutrientes, a vida voltou à planta.
Isso não significa, ainda, a solução para a doença, mas sim uma forma de manejo dos pomares, permitindo a convivência de plantas fortes contra as obstruções causadas pelos chamados “biofilmes”, pelotas grudentas que tomam conta dos pequenos vasos das folhas.
A luta contra o greening também trouxe a superação para a costumeira falta de verbas que afetas as pesquisas no Brasil. Por meio de leis inovadoras, o governo paulista permitiu a criação de startups incubadas dentro do Centro de Citricultura Sylvio Moreira, em Cordeirópolis, SP, dedicado integralmente à pesquisa citrícola.
Uma das pesquisadoras do IAC, a Dra. Simone Cristina Picchi, criou uma empresa, a Ciacamp, que se associou à AmazonAgrosciences, fabricante de fertilizantes de São Carlos, SP, que formulou um adubo líquido denominado “GranBlack”, que já está sendo utilizado experimentalmente por 40 citricultores. Esse produto tem a ação de “desentupimento” citada, e o resultado tem sido menor queda de frutos, maior resistência ao ataque dos psilídeos e rejuvenescimento dos laranjais. O GranBlack não é um antibiótico, mas sim um rejuvenescedor da planta. É importante esse esclarecimento, pois outra batalha ocorre em torno do produto do IAC: empresas concorrentes denunciaram à Anvisa (e ao Ministério da Agricultura) que o GrandBlack seria um agrotóxico e necessitaria de registro mais severo.
Os pesquisadores do IAC já explicaram que o produto é um rejuvenescedor vegetal, mas, na dúvida, o Ministério da Agricultura exige mais testes. Com isso, os pesquisadores do IAC e, por extensão, os citricultores se deparam com a luta contra a burocracia. Enquanto isso, o psilídeo continua voando e o greening continua entupindo os floemas, colocando em risco a posição do Brasil de maior produtor e exportador de suco de laranja do mundo.